John Terry negou que fosse um boicote a Vicki Sparks e disse que a TV estava com defeito. No Brasil, emissora inova com trio de narradoras
A Fox Sports protagonizou a grande novidade da imprensa esportiva nacional nesta Copa do Mundo. A emissora levou para seu quadro de profissionais na Rússia três narradoras, vencedoras do concurso Narra Quem Sabe: Manuela Avena, Isabelly Morais e Renata Silveira (nesta ordem, na foto de abertura).
Isabelly tornou-se a primeira mulher brasileira a narrar um jogo na principal competição de futebol, responsável pela transmissão da partida de abertura da Copa. A iniciativa vem sendo elogiada tanto por colegas como por torcedores.

Durante o jogo Argentina x Croácia, troquei a voz e a irreverência de Milton Leite, meu locutor preferido, pelo Fox Sports 2, onde a narração seria a cargo de Renata Silveira. Primeira impressão: timbre límpido, fala firme, ritmo adequado. Ficou atenta aos detalhes da partida e interagiu bem com as mensagens dos espectadores. Claro que a experiência dará ainda mais desenvoltura a ela, como ocorre com qualquer profissional e compará-la ao narrador de minha preferência é sem sentido.

Mulher no futebol, convenhamos, não deveria ser novidade faz tempo. Elas estão cada vez mais presentes à beira dos gramados, como repórteres de campo, e nas bancadas dos estúdios, como apresentadoras e comentaristas. Ainda sofrem, porém, com uma rejeição dissimulada. Durante o programa Troca de Passes desta quarta-feira, 20, do canal Sportv, ao comentar a presença de iranianas nos estádios da Rússia (elas são proibidas de frequentá-los em seu país), Ana Thais Matos ressaltou que “ainda é anormal ter mulher inserida num meio tão masculino como o futebol”, completando: “Mas é uma geração de transição, acredito que para os próximo dez ou vinte anos não seremos tratadas como aberrações”.
O colega de bancada Thiago Maranhão, então, a questionou sobre como ela recebe a função que desempenha: “Ana, você recebe muitas mensagens no Twitter dizendo ‘ah, que bom você representar a gente’. Você carrega um pesinho no ombro?”. A resposta:
— Muito, o erro é cinco vezes maior do que o acerto.
Que o diga Vicki Sparks, da BBC, sobre esse peso. Ela também quebrou um tabu nesta Copa, ao narrar Portugal x Marrocos. Logo na primeira partida, teve o desprazer de virar o centro das atenções das redes sociais, por conta de uma postagem do ex-capitão da seleção inglesa, John Terry, com a seguinte legenda sobre o jogo, no Instagram:
Having to watch this game with no volume” (“Tendo de assistir esse jogo sem volume”)
Claro que repercutiu muito mal para o jogador, ex-astro do Chelsea e hoje sem clube, aos 37 anos. Em um vídeo, ele refutou com veemência que houvesse qualquer referência à narradora, alegando ter encontrado a TV com defeito no áudio após voltar de um descanso longe de casa.
Das duas, uma:
a) foi muita infelicidade de Terry, já que não é comum uma televisão estragar o áudio e teve o azar de ser confundindo por isso ao lamentar nas redes sociais justamente no primeiro jogo narrado por uma britânica;
b) foi misoginia mesmo, seguida de um vídeo com muito cinismo.

Na verdade, não importa tanto. Importa muito mais elas estarem ocupando um espaço tão hegemonicamente masculino. Nunca foi fácil para as mulheres. E, se a situação está difícil ainda na Europa, podemos esperar um longo caminho até que haja a naturalização de sua presença por aqui em todas as funções. Longo no esporte bem como em qualquer outra esfera da sociedade. O importante, porém, é caminhar.